Hoje acordei pensando no filme“Alceste
à bicyclette - “Pedalando com Molierè”, no Brasil –;
talvez porque tenha despertado mais cedo do que pretendia, talvez porque começasse a cair em minha cama a pioggia sottile di pensieri cattivi
(La Campana, Francesco
de Gregori).
No enredo, um ator desiludido com a
falsidade da vida em sociedade abandona seu ofício, muda-se para uma
pequena ilha no oeste da França (Ile de Rè) e
passa a viver recluso. Lá o encontra o outro protagonista, um ator
de sucesso na televisão francesa, que decide procurar pelo antigo
companheiro de atuação, movido pelo desejo de montar a peça O
Misantropo, de Molière. O ator recluso a princípio recusa o
convite, invocando sua renúncia à atuação, mas depois fica
visivelmente seduzido pela ideia, ao saber que se trata de uma obra
que lhe interessa tanto – quem sabe porque retrata seu atual
sentimento em relação ao mundo. Propõe ao visitante que ensaiem
por alguns poucos dias, para que possa decidir se aceitará o
convite. Daí em diante, os protagonistas encenam passagens do
Misantropo entre vinhos, vieiras e passeios de bicicleta. Tudo corre
bem, e surge até uma fagulha de amizade. Mas eis que surge uma
mulher entre os dois. E o inevitável acontece.
Qualificar como “inevitável” o que
acontece nesse momento – e essa é exatamente a palavra com que o
ator televisivo explica o ocorrido ao ator recluso – talvez seja o
que define a perspectiva do filme: não há como escaparmos da
desilusão de vivermos em sociedade.
É inevitável que soframos com a
falsidade e o egoísmo alheios, pois na vida, como no teatro, a
habilidade em interpretar papéis é o que garante o sucesso dos
atores – e a recusa radical à interpretação implica isolamento e ressentimento que degenera em misantropia.
Uma perspectiva pessimista, sem dúvida.
Mas nada implausível. J'e suis désolée.