"...Mas o quociente de dor que a gente sofre já não é chocante o bastante para não precisar de uma amplificação ficcional, que dê às coisas uma intensidade que é efêmera na vida e que por vezes chega a passar despercebida? Não para algumas pessoas.
Para umas poucas, muito poucas, essa amplificação, que brota do nada, insegura, constitui a única confirmação, e a vida não vivida, especulada, traçada no papel impresso, é a vida cujo significado acaba sendo mais importante..." (Philip Roth, Fantasma Sai de Cena).

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Philip Roth

Ia escrever agora sobre Philip Roth. Escrevi e apaguei três vezes o que escrevi - contrariando os princípios 1 e 2 da declaração de princípios do blog (primeiro post).

Isso quer dizer ou que não estou a fim de escrever, ou que não estou conseguindo suficientemente colocar as minhas idéias no papel, ou as duas coisas juntas, ou nenhuma delas. Na verdade não interessa muito.

Interessa o que é passional. E a minha escrita acaba sendo, na maioria das vezes, passional.

Quando a paixão arrefece, por um motivo ou outro (hoje foi um dia infernal na Ilha!), então não consigo gostar do que escrevo.

Então gostaria de entender porque não podemos sempre nos manter apaixonados por algo, melhor dizendo, viver no calor da paixão? Por que tudo esfria, perde a graça, desbota?

Se pudesse, gostaria de controlar meu nível de paixão pela vida, de modo que pudesse sempre regular a intensidade dos meus atos: mais apaixonado pro que valer mais, como escrever um poema de amor; menos apaixonado pro que valer menos, como brigar com alguém...

O que eu ia escrever sobre o Philip Roth é que os livros dele me lembram a importância de estar vivo. Ou porque contém relatos aterradores sobre a força animal das paixões e obssessões humanas (tema recorrente pra mim também...), ou porque relatam assombrosamente o fenômeno do envelhecimento, da morte, da solidão (como em seus últimos livros lançados no Brasil: O Homem Comum, e Fantasma Sai de Cena - esse último é o que estou lendo agora).

Em suma, Philip Roth escreve só sobre o que interessa mais ao ser humano: o sexo, a morte e a família (não nessa ordem necessariamente).

E em todos seus livros está a marca humana, aquela condição animal e racional de um ser que ama mas foge do amor pela razão, e que é racional mas foge da razão pelo amor...

Na real, hoje não saberia dizer exatamente como é Philip Roth, mas posso recomendar seus livros pra quem, como eu, gosta do que é humano, altamente humano, com toda fraqueza, dor, desespero, solidão e desejo que são ínsitos aos indivíduos.

Eu ia dizer também que algumas passagens de livros como o Homem Comum (o que mais me marcou, porque contribui para uma tomada de decisão em minha vida), me lembram a letra de Time do Pink Floyd (já mencionada no blog)...

...principalmente no trecho em que diz:

"You are young and life is long and there is time to kill today
And then one day you find ten years have got behind you
No one told you when to run, you missed the starting gun"

Dez anos passam rapidamente...

sábado, 24 de janeiro de 2009

O INFINITO EM 3D

Hoje me assustei. Conversava com um amigo meu no msn; ele me contava sobre o novo site da empresa dele; mandou o link, e eu acessei.

Vi na página inicial um logo muito bonito, um visual assim espacial, e disse pra ele: "muito legal a página inicial". Ao que ele me respondeu:

"É O INFINITO EM 3D!"

Fiquei pasmado com a afirmação. Primeiro, eu não consegui desenhar na minha cabeça o infinito; imagina só, tanta coisa, num desenho... Depois, pra agravar, eu tive de pensar no infinito em três dimensões, com altura, com profundidade, com largura...

Meu cérebro simplesmente travou.

Como meu amigo deve ter percebido a minha dificuldade em compreender o conceito, ele me disse:

"É O OITO DEITADO".

Pronto, aí piorou... Como assim, o oito deitado? O que o número oito e o infinito têm em comum?

Será o número oito o resultado da equação misteriosa que - dizem os místicos - explicaria o funcionamento de tudo que existe (acho que vi um Arquixo X sobre isso, há mil anos atrás)...

Como meu desepero ficasse evidenciado nas inúmeras interjeições que dirigi ao meu amigo, ele resolveu amainar minha angústia e mandou o seguinte link http://pt.wikipedia.org/wiki/Infinito.

Finalmente uma explicação racional: o "oito deitado", me explicou a enciclopédia, é a Lemniscata de Bernoulli, também conhecida entre os matemáticos como a representação gráfica do infinito.

Diante disso, senti duas coisas: primeiramente, alívio por ter salvo meu cérebro (já que ele provalvemente não descansaria até desenhar o infinito em três dimensões); depois, me deparei com uma dúvida: será que me ensinaram isso na escola? Alguma vez eu utilizei o "oito deitado" em alguma equação perdida no passado juvenil?

Ou eu teria faltado ao bimestre letivo em que foi ensinada essa matéria? Eu estava usando drogas à época?

Onde está minha matemática, afinal?

De toda forma, pra não me sentir solitário em minha ignorância (creio ser uma tendência natural do ser humano procurar seus defeitos nos outros), eu perguntei a uma pessoa bem chegada: você sabe o que significa o "número oito deitado"?

A pessoa respondeu: "duas pessoas transando?"

Bem, a resposta não me consolou muito, porque eu, conhecendo o espírito elevado da pessoa que respondeu, sabia que ela deveria estar brincando comigo...

Então, respondi-lhe: "não, não são duas pessoas transando, é o símbolo do infinito". E a minha interlocutora afinal confessou: "sim, eu me lembro, tive isso na escola"...

Portanto, a conclusão que tiro disso é que perdi minha matemática; não sei onde ela está.

E existe uma parte boa em tê-la perdido: é que por um breve momento acreditei que o infinito, que toda matéria e todo vazio existentes, pudessem caber num desenho, num site, numa foto, num instante.

Vou sentir saudade desse momento.

fim de semana na ilha metafórica

Sexta-feira, 19h30m. O que vislumbro do fim de semana na ilha metafórica (v. o antepenúltimo post para entender) não é muito animador. Vejamos quanto tédio se pode aguentar, e a que idéias malucas isso pode me levar.

Música pra eu escutar agora: smile (Charlie Chaplin/John Turner/Geoffrey Parsons), na voz da Madeleine Peyroux, pela oportuníssima letra.

Música pra eu não escutar agora: time (Pink Floyd); sua letra altamente verdadeira e reflexiva me deixaria um pouco mal (aliás, será objeto de um post em breve).

that's all, folks!

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Para além do bem e do mal (ou o blogadicto e a espinha de peixe)

Reflexão filosófica nº 02/2009: uma obsessão pode ser uma coisa boa?

Blogadicto é um neologismo; ontem, quando pensei na palavra, até imaginei que eu seria o inventor dela... Quanta pretensão. No grande G (posso chamá-lo assim? acho que é uma apropriada denominação, pois sua onisciência e popularidade lembram o grande irmão do George Orwell), enfim, no google encontram-se 4.530 resultados para a pesquisa do termo "blogadicto".

Isso só demonstra que não há mais nada inédito no mundo, ou que tamanha é a velocidade da difusão das invenções que aquilo que ontem era inédito, hoje é popular - acho que essa última hipótese é mais razoável.

Mas, retomando a linha de pensamento, blogadicto quer dizer viciado em blog, como drogadicto. Fácil.

O que não é fácil é descobrir-se um blogadicto, e acho que estou passando por esse processo de descoberta.

Digo isso porque há três dias só penso nesse blog; não estou me arrependendo de tê-lo criado, já que seus benefícios (e falarei sobre isso em outra hora, mas já podem ir lendo "Redação Inquieta", do Gustavo Bernardo) são maiores de que seus malefícios.

Mas o fato é que estou me dando conta de que a situação está fora do controle.

Por exemplo, agora deveria estar escutando alguma canção lenta do Mellon Collie and the Infinite Sadness (v. The Smashing Pumpkins), como faço todo dia após almoçar, tentando me recuperar para o turno da tarde (sempre mais violento que o round inicial).


Outro indício de que estou me tornando um blogadicto é que a todo momento elaboro textos na minha cabeça, coisas para postar aqui... Isso até seria bom, se eu não tivesse mais nada pra fazer da minha vida.

Mas o exemplo máximo da minha iminente (ou consumada) blogadição é o seguinte: hoje, durante o almoço (trinta minutos atrás), uma pedaço bem pequeno de espinha de peixe cravou entre a minha gengiva e a parte de trás de um dos meus dentes. Tive de correr para o banheiro do restaurante. Não vale a pena contar como, quinze minutos depois, eu consegui remover a inoportuna espinha.

O fato é que não consegui mais almoçar. Não por causa da dor causada pela espinha já extraída. Mas porque fiquei pensando: qual a reflexão filosófica que posso postar no meu blog a partir dessa experiência ridícula?

Assim, como uma coisa leva a outra, estou escrevendo esse texto agora. E o que pude concluir é:

a) não há sentido a se extrair no fato de uma espinha de peixe cravar na sua gengiva;

b) as reflexões filosóficas, no meu caso particular, não devem ser "forçadas" a partir de fatos do meu dia-a-dia;

c) e, sim, estou me tornando obcecado por este blog.

A partir dessa última conclusão - de que estou mesmo viciado no blog - eu me sinto confortável para formular, finalmente, a reflexão filosófica nº 02/2009, a qual, vem em forma de pergunta: uma obsessão pode ser uma coisa boa?

Vale a pena refletir, porque - embora inicialmente nos sintamos inclinados a dizer que não, que obsessões são sempre ruins - é possível que grandes coisas sejam conquistadas a partir de obsessões.

A paixão, por exemplo, é uma obsessão socialmente aceita. Não estou falando aqui do "amor com sabor de fruta mordida" (Cazuza), mas da paixão que devora nossa mente quando nos deparamos com o objeto do nosso desejo.

Nesse caso, se a paixão for mesmo uma forma de obsessão, e se a paixão muitas vezes evolui para uma forma mais evoluída de sentimento - amor -, logo, estou a concluir que as obsessões (ao menos aquelas saudáveis, como escrever um blog, ou pintar ou escrever) podem, sim, ser coisas boas (ou nos levar a coisas boas).

Ou melhor dizendo: uma obsessão é algo além do bem e do mal, porque implica na entrega quase que absoluta de nosso ser em prol de algo que acreditamos que seja, praticamente, o sentido do instante vivivo. E quem poderia criticar isso?

Essa é, então, a minha conclusão: não julguemos as obsessões, pois não sabemos o que há por trás delas, não sabemos onde elas vão acabar, e, afinal, são formas intensas de se viver algo.

De mais a mais, não me sinto autorizado a discordar de Nietzsche, para quem: "O que se faz por amor sempre se faz para além do bem e do mal". (in Além do Bem de do Mal).

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

...the future's not ours too see...

Reflexão n. 01/2008 (primeira do blog): "the future's not ours to see".

"The future's not ours to see" é um trecho famoso da letra da música "que sera, sera", tema do filme "O Homem que sabia demais" (v. wikipédia), mas pode ser encontrada, se não me engano, no filme "Em carne viva" (In the flesh?), com a Meg Ryan (bom, diga-se de passagem).

A letra, evidentemente, diz que não podemos ver o futuro, ele não nos pertence, e a vida será o que tiver de ser...

Essa música me veio à mente à propósito de uma entrevista que assisti ontem, num desses vários canais religiosos que são captados aqui nessa ilha escaldante em que resido("ilha" no sentido metafórico; escaldante: nem tão metafórico assim).

Enfim, havia esse cientista ortomolecular, cujo nome não vem ao caso (nem lembro mesmo), e explicava sobre um laboratório nos EUA para onde podemos mandar amostras de nosso sangue, via convênio com a FEDEX.

Uns trinta dias após receber a nossa amostra de sangue (e certamente um pagamento razoável), esse laboratório nos remeteria uma análise de nossos genes, com informações sobre todas as doenças para as quais temos predisposição (sem hífen, certo?).

Juntamente com esse prognóstico genético sobre o futuro de nossa saúde, nos é enviado uma indicação terapêutica para evitar a instalação dessas patologias a que estamos propensos.

A terapêutica, segundo contou esse médico na entrevista, seria absolutamente não-invasiva e não-medicamentosa, consistindo basicamente em sugestões de mudanças alimentares e de estilo de vida (aquele xalalá da prática de exercícios físicos e redução do stress - como se isso fosse assim so easy)...

Mas o fato relevante, e o que me assusta pra valer, é a constatação de que - hoje - o futuro já não é insondável; ao menos o futuro de nosso corpo. Quer dizer, já podemos, mediante uma simples remessa de um frasco de sangue pra esse laboratório (sabe-se lá se quantos outros não existem...), conhecer quase todas as doenças que nos acometerão (verbo horrível) em um futuro mais ou menos próximo.

Isso é ótimo, dirão os prudentes, pois podemos tratar com antecipação aquelas patologias a que estamos geneticamente predispostos. É o supra sumo da medicina preventiva!

Mas eu pergunto: como nos sentiremos sabendo, por exemplo, que temos 90% de chances de contrair um câncer altamente letal, daqui a, digamos, uns 10 anos?

Alguém já pensou como se sentiria? Como isso mudaria os rumos de sua vida?

Creio que não, creio que a maioria das pessoas nunca pensou nisso, já que o dólar está subindo, o Obama está inciando seu mandato, o IPI foi reduzido e, enfim, há tanto coisa pra ocupar nossas mentes...

Em suma, eis a reflexão filosófica que proponho como inaugural desse blog: o que queremos pra nossas vidas - conhecer o futuro do nosso corpo, em termos de doenças que nos espreitam mais de perto, tendo que lidar, consequentemente com a tristeza ou a alegria que daí pode advir; ou queremos gozar da ilusão de que somos livres e que nosso corpo vai aguentar nos levar até onde desejamos?

Eu não sei o que quero, mas isso me deixou bolado, e compartilho essa angústia (também nem tão grande assim) com a vasta multidão (hipérbole ou redundância?, não: ironia) de leitores desse blog.

Pra finalizar em total sintonia com o que foi escrito, recomendo - a quem por ventura ainda não conheça - o filme Gattaca, com o Ethan Hawke, que trata de uma situação que, há grandes chances, viveremos em breve: o preconceito advindo da manipulação genética, ou seja, os que são manipulados antes de nascer (e por isso são quase perfeitos) e os que são normais, como você que está lendo esse blog.

Segundo me contou hoje um amigo meu, o filme foi baseado em Admirável Mundo Novo, do Aldous Huxley, embora não tenha encontrado na rede confirmação pra essa informação (há uma boa crítica sobre o filme em http://www.telacritica.org/gattaca.htm).

Então é isso: continuarei com canção na cabeça, cantando baixinho ao me deparar com a máquina do mundo (drummond): "the future's not ours to see" - embora isso já signifique o mesmo que um dia significou...

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

aprendendo a bloggar (existe esse verbo?)

A primeira inserção é essa: não sei bloggar. A idéia me veio à mente na hora da siesta - embora esse seja o horário para desacelerar a mente, hoje, ou foi ontem?, eu tive essa revelação: fazer um blog. Mas, enfim, não sei bloggar; espero aprender com o andar da carruagem. Aliás, faço um parêntese autoreflexivo (com ou sem hífen, afinal???): acho que devo assumir o fato de que há coisas que não sei fazer, e simplesmente arriscar atingir meu objetivo, apesar de todas as chances de erro, apesar de todas adversidades, e, principalmente, apesar de todas as censuras emanadas das pessoas perfeitas e inteligentes que habitam o mundo à minha volta.

Não sei qual o tamanho de uma inserção. De fato, repito, não sei nada sobre o que estou fazendo, mas de toda forma anoto (pra mim mesmo) que estou curtindo a sensação.

Pra organizar minha nova vida, ou seja, a vida que será exposta nesse blog, faço o ESTATUTO DO FILÓSOFO AMADOR - o qual conterá regras, dirigidas a mim mesmo, of course, visando à elaboração e à manutenção desse blog.

Vem a calhar um pronunciamento solene:

"NESSA DATA DE HOJE, EU, FILOS, DECRETO A ABERTURA DESSE BLOG, O QUAL SE REGERÁ, NA SUA ELABÕRAÇÃO E MANUTENÇÃO, PELOS PRINCÍPIOS QUE SEGUEM:

1) Jamais deixar o cursor piscar por mais de 1 minuto; as postagens devem preservar a fluidez do pensamento, em prol da espontaneidade das manifestações postadas;
2) Jamais reler mil vezes cada postagem (como habitualmente faz o criador desse blog); a justificativa é a mesma usada para o item 1;
3) Não ter vergonha das informações postadas;
4) Não ter vergonha dos erros eventualmente cometidos;
5) Aceitar de bom grado as críticas eventuais (ou certas), sempre lembrando que não há consenso no mundo (felizmente).
6) Assumir esse blog como um projeto experimental e totalmente pessoal;
7) Não se importar com o fato de que, para outras pessoas, um blog seja uma coisa banal e corriqueira."

Feito isso, encerro essa primeira inserção no meu blog.

Esclareço apenas uma coisa: não ia disponibilizar esse blog ao público antes que ele estivesse completamente formatado e com algumas postagens que pudessem entreter os visitantes menos apressados.

No entanto, considerando o que consta na cláusula 4 da declaração de princípios do blog, já estou disponiblizando ao mundo, vasto mundo, o teor integral do Filósofo Amador.

Apenas ressalvo aos interessados (os que viram algo de interessante nessas palavras escritas de sopetão) que o conteúdo do blog aumentará em breve. Esse é meu desejo.