"...Mas o quociente de dor que a gente sofre já não é chocante o bastante para não precisar de uma amplificação ficcional, que dê às coisas uma intensidade que é efêmera na vida e que por vezes chega a passar despercebida? Não para algumas pessoas.
Para umas poucas, muito poucas, essa amplificação, que brota do nada, insegura, constitui a única confirmação, e a vida não vivida, especulada, traçada no papel impresso, é a vida cujo significado acaba sendo mais importante..." (Philip Roth, Fantasma Sai de Cena).

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Não há arrependimentos...

Bem, vou ser breve, pois estou em uma lan house e preciso correr pra casa. Há coisas a fazer.

Mas compartilho uma das frases mais inspiradoras que li nos últimos tempos, e absolutamente apropriada ao presente momento. Veio de uma amiga, que disse para eu colocar amor em todos meus passos, pois

"não há arrependimentos quando há amor"...

Obrigado pelo incentivo.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Palavra repetida

“A falta que todo homem carrega consigo o tempo todo é aquela que explica e dá sentido a boa parte dos seus atos e lapsos.

Eis a palavra, testemunhando a ausência e a falta”.
Gustavo Bernardo, Redação Inquieta.


Tenho a sorte de trabalhar com a escrita. Não exatamente com a escrita, mas utilizando as palavras para meu sustento (“lutar com palavras é a luta mais vã, entanto lutamos mal rompe a manhã...” O Lutador, Drummond).

E os textos que escrevo a trabalho, embora tão formais como exige o meio (não me refiro ao blog, evidentemente), servem de espelho à minha falta.

Sim, somos seres faltantes. É uma condição humana. Não sentir falta é estar doente, ou morto. Não é essa a novidade que quero contar.

Arriscaria dizer que todos põem sua falta em algo do dia-a-dia: na fala, nos gestos, nas roupas, no caminhar...

Eu, como dito, deixo que minha falta se misture às palavras que escolho para me comunicar (essa constatação, devo dizer, é relativamente recente para mim: há uns dois anos apenas percebi o quanto posso ler nas entrelinhas das minhas palavras, sejam elas ditas ou escritas).

Pois bem, um dia desses, escrevendo uma anotação qualquer, percebi o quanto havia usado repetidamente uma determinada palavra, a palavra “já”.

A partir de então, comecei a prestar a atenção nos textos que escrevia, e me dei conta da utilização constante e abusiva do “já”. Estava escrevendo: “já que isso havia acontecido” e “já em relação a tal coisa” e “já havia sido dito” e “já mencionado” e daí pra fora...

Sempre vi como pobreza do escritor a repetição de palavras (salvo quando exigida para a segurança e clareza de certos textos). Mas nesse caso, a repetição em que estava incorrendo aborreceu-me menos pela questão formal do que pela questão simbólica.

Explicando, o que me deixou inquieto não foi detectar nos meus textos um defeito que sempre me desagradou nas obras alheias; o que me deixou inquieto foi desconhecer a razão pela qual eu estava repetindo especificamente a palavra “já”.

Obviamente nem me ocorreu que fosse mero acaso a eleição daquela palavra. A psicanálise não me deixa acreditar em acasos, quando se trata de ações humanas.

Além disso, se escrever é um exercício de auto-afirmação, há de se admitir que as palavras que não escolhemos – mas que vem à tona, do poço escuro do inconsciente – também querem afirmar algo, quererem mostrar algo que não desejamos ver conscientemente...

Ou seja, “a palavra testemunha a ausência e a falta”. E alguma falta, no meu caso, estava sendo testemunhada pela palavra repetida.

Nem preciso dizer que acabei realizando uma espécie de "auto-análise" a partir da palavra “já”, tentando buscar os significados inconscientes que ela tinha pra mim.

O resultado disso?

Nada de diferente à minha volta.

Mas posso entender agora, com relativa clareza (nunca há certeza), a mensagem que palavra repetida trazia... e sobretudo posso ver qual era a falta que ela testemunhava.

(e dar-se conta é sempre o primeiro passo...).

quinta-feira, 2 de abril de 2009

A planta da infância

"Que culpa temos nós dessa planta da infância,
de sua sedução, de seu viço, de sua constância?"
(Jorge de Lima)

Não sei ao certo o que escrever... mas estou sob a influência de uma conversa que tive no último final de semana... e quando algo não sai da minha cabeça, é porque devo escrever sobre isso.

Bem, a conversa era sobre seguir o próprio desejo, a despeito de o quanto possamos ser criticados, censurados e mesmo excluídos por conta dessa decisão.

Quando minha interlocutora comentou que se sentia recriminada pela sociedade (e especialmente por sua mãe), eu respondi: o que importa é que você fez o que desejava, mas não pode ter a ilusão de “viver é indolor” (assumi que a frase “La ilusión de que vivir es indoloro” não era minha, mas do Jorge Drexler – Soledad).

Falei também que ninguém tem culpa de ser como é. A culpa, na verdade, é de nossos pais. Mas eles também não são culpados, os culpados são os pais deles, que os fizeram ser como são... e assim por diante, culpa transferida para as gerações anteriores, até remontar o primeiro pecado, o pecado original (que, dizem uns, não foi o ato de desejar, mas o ato de ter consciência de si, tomar pra si a sabedoria que só deus poderia ter...).

Enfim, ninguém tem culpa da planta da infância, como diria o Jorge de Lima.

Mas é claro que essa proposição (ninguém tem culpa da planta da infância) não significa transferir toda responsabilidade por nossa personalidade a nossos pais. Não é isso.

É apenas reconhecer que, no processo de formação do indivíduo, atua essa força suprema, avassaladora, personificada no pai e na mãe. A lei e o amor tomam corpo nessas pessoas que moldam, pro bem e pro mal, o barro informe da nossa psique infantil...

(não falarei de Freud; não quero ser chato: a psicanálise é tão fascinante quanto impopular nesse país).

O fato é que muito da nossa angústia pode ser extravasada quando identificamos a origem das questões de nossa personalidade – e a origem é quase sempre tão importante quanto remota...

Então, com esse texto cheio de reticências (como está a minha compreensão sobre as coisas), acho que estou dizendo que a vida, embora não seja indolor (como canta o Jorge Drexler) pode ser menos tormentosa, menos opressora.

Mas pra isso é necessário navegar em águas mais profundas...

“Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor...

Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.”

(Fernando Pessoa).