"No caminho, com Maiakovski" é um poema do brasileiro Eduardo Alves da Costa, que contém versos muito conhecidos, embora equivocada e comumente atribuídos ao poeta russo. São esses:
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
Contundentes, os versos falam sobre as
consequências da nossa omissão em face do que é indiscutivelmente
errado, praticado conosco ou com outros; falam das consequências de nossa inércia pelo medo.
Ao ler esses versos, difícil não vir
à mente tantas cenas do cotidiano, recente ou remoto, em que nos
calamos por medo de sermos prejudicados por pessoas injustas, arbitrárias, sádicas, mesmo
sabendo da flagrante injustiça que impingem a nós ou a outrem.
O contraponto, diria alguém disposto a
racionar, é que às vezes calar é uma estratégia de sobrevivência:
gritar palavras de ordem contra a irracionalidade é estéril; tentar
punir a quem o sistema protege é inócuo, e só nos prejudica.
Eis o eterno dilema: escancarar o que
está errado, e sofrer as consequências, ou silenciar e sofrer
igualmente pelo sentimento de que nossa voz nos é arrancada pelo
medo...
Se sofrer, então, é inevitável,
vamos à luta – diria um idealista.
Mas se é inútil reagir, porque a
injustiça de um mundo errado não se corrige, nos recolhamos à vida
entre os nossos, onde há respeito e lógica, e não escancaremos as
ilegalidades que vemos a toda hora – diria um realista.
Em qualquer caso, sempre queremos viver
em um mundo onde não existe tal dilema, ou porque os “poderosos”
não cometem arbitrariedades, ou porque são sempre punidos quando as
cometem. Esse mundo não existe; e algo deve ser feito, pois pela
inércia nada muda. Esse algo, contudo, parece se encontrar a meio
caminho entre um ataque suicida e uma postergação medrosa: deve ser
uma ação precisa e calculada, atingindo no cerne as ações
arbitrárias. No cálculo, deve se pesar inclusive se é possível
melhorar o mundo de forma mais efetiva por outros meios menos
conflitantes, e também o peso que implicará aceitar nossa inação.
Mas se dessa equação resultar a necessidade de agir, aí então só
resta acreditarmos que somos fortes, e que resistiremos ao
contra-ataque dos ignóbeis, daqueles que dormem tranquilos porque
têm certeza de que ninguém, nunca, reagirá às suas
arbitrariedades, e, se nenhuma justiça sobrevier disso tudo, nos
restará aos menos saber do sono de que serão privados esses
injustos, graças ao barulho estrondoso de nossa ação inesperada...
Nenhum comentário:
Postar um comentário