"...Mas o quociente de dor que a gente sofre já não é chocante o bastante para não precisar de uma amplificação ficcional, que dê às coisas uma intensidade que é efêmera na vida e que por vezes chega a passar despercebida? Não para algumas pessoas.
Para umas poucas, muito poucas, essa amplificação, que brota do nada, insegura, constitui a única confirmação, e a vida não vivida, especulada, traçada no papel impresso, é a vida cujo significado acaba sendo mais importante..." (Philip Roth, Fantasma Sai de Cena).

sexta-feira, 22 de maio de 2009

CARTOLA: A Sorrir.

Cheguei em casa (já estou chamando quarto de hotel de “casa”) cheio planos, mas tive de subir pelas escadas: não havia energia pra mover os elevadores. Não havia energia pra mover nada; só essas idéias.

Daí me dei conta (e logo me esquecerei) que nunca sabemos quando a falta de algo vai nos deixar em um quarto escuro, só com os planos concebidos e não executados... "Tantos planes, tantos planes vueltos espuma..."

Isso me remeteu à noite de ontem, quando veio até minha mesa (em um restaurante da cidade), um senhor de paletó, chapéu Panamá, maquiagem de palhaço melancólico, e cavaquinho em punho. Era um artista de rua. Perguntou se podia cantar uma música, e iniciou a canção (muito bem cantada):

A sorrir
Eu pretendo levar a vida
Pois chorando
Eu vi a mocidade perdida

Fim da tempestade
O sol nascerá
Finda esta saudade
Hei de ter outro alguém para amar

Aquilo fez todo sentido. Assim como a falta, agora da luz, está fazendo. E a ausência de algo não é de todo ruim, porque nos obriga a sermos mais presentes, e menos hipotéticos. Mais realizações e menos cogitações, como esse texto, que sai assim às pressas e à primeira palavra, pois a bateria do note também vai faltar... A ausência leva à urgência, e esta nos leva a sermos menos exigentes com nós mesmos...

Se não fosse a urgência de agir, talvez nunca realizássemos certas coisas, em relação às quais ensaiamos demais...


¿Quien sabe cuándo,

cuándo es el momento de decir: ahora?
Si todo alrededor te está gritando:
¡Sin demora, sin demora!

(Jorge Drexler)

Um comentário:

  1. "Tudo de alegrias e de tristezas conheci
    Coisas do amor e do sofrer eu já senti
    Nada me transforma a alegria de viver
    Vêr a noite vir e sorrir ao sol nascer
    Vivo esperando o novo dia
    Que irá trazer a luz que sempre ficará..." Cartola

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